terça-feira, 22 de junho de 2010

O ROCK NA TERRA DA COPA

SPRINGBOK NUDE GIRLS, um dos maiores nomes do rock sulafricano hoje.


Hoje, os olhos do mundo se voltam para a África, já que o continente mais carente da Terra tem sua primeira copa da Fifa.

Não é surpresa nenhuma a região aparecer por esta coluna, haja vista que de lá sempre saíram verdadeiras joias sonoras. Na abertura mesmo, foi possível vermos uma mescla de estrelas do pop mundial com figurinhas carimbadas da música africana contemporânea, principalmente astros renomados da world music. No entanto, o foco de hoje é sobre uma vertente sonora pouco cogitada da área: o rock branquela!


UMA SUTIL REVOLUÇÃO


Tal qual sempre nos foi mostrado, em nossa vida escolar e também nos inúmeros noticiários, a África do Sul (principalmente) como palco de uma horrenda guerra entre os negros nativos e uma minoria branca detentora do poder, até o começo dos anos 90, época em que o macabro regime segregacionista do apartheid deixava de (formalmente) existir. No entanto, o que poucos sabem é da ocorrência de uma revolução silenciosa, porém muito barulhenta, que se desenvolveu em meio aos brancos.

No final da década de 50, a ideia de juventude transviada dava as caras na África do Sul e aquele estilo chamado rock'n'roll começava a tomar de assalto as mente e os corpos dos jovens. Acontecia, enfim, uma situação inusitada: o blues, criação dos negros do outro lado do Atlântico, passava a criar suas raízes no seio das famílias conservadoras, mexendo com a cabeça de seus filhos e, por sua vez, semeando o inconformismo com tudo e todos, ao passo que as famílias liberais de classe média recebiam com simpatia algo que encaravam apenas como mais uma "tendência moderna".
Surgiam os primeiros roqueiros por lá: The Meteors, The Vikings, The Amazons, a primeira banda totalmente feminina da região, só para citar alguns.


CHERRY WAINER, a primeira rockstar sulafricana!


É curioso observar que, a exemplo das Amazons, a presença feminina na produção roqueira sulafricana era incrivelmente forte. Se hoje ainda temos criaturas fabricadas pela indústria e que ganham espaço apenas pelos atributos físicos, à época, por aqueles lados, era preciso ter talento de fato, e ainda sim, era deveras árduo conseguir um bom espaço, já que rock era tido como música marginal. Logo, viam-se na obrigação de sair daquele ambiente conservador, racista e machista, para tentarem a sorte em outros lugares do mundo. E foi justamente o que aconteceu com a tecladista Cherry Wainer e as cantoras Sharon Tandy e Dana Vallery; o produtor Frank Fenter; os ex-Vikings, Manfred Lubovitz (Manfred Mann) e Harry Miller (King Crimson); Blondie Chaplin e Ricky Fataar (The Beach Boys), John Kongs e outros tantos que se mudavam para a Inglaterra, Canadá, EUA e Australia.


SHARON TANDY, diva sulafricana, de origem judaica,
que teve o apoio de muita gente de peso, como Jimmy Page e Isaac Hayes.



Êxodos à parte, muito das preciosidades roqueiras redescobertas pelo mundo através da internet, vieram da África do Sul: June Dyer, John E. Sharpe & The Squiers, The A-Cads, The Giants, The Couriers, The Gonks, The Invaders (primeira banda rockeira só de músicos negros) e muitos outros mais, são apenas uma parte dos nomes que então fomentavam a rebeldia juvenil. Todavia, se muitos de lá saim, para lá outros tantos iam para a sorte tentar, como Mickie Most, Bill Kimber e Dickie Lodder, e não obstante, tornavam-se verdadeiras estrelas regionais.



THE INVADERS,
primeira banda de rock multirracial da região,
formada por negros e indonésios.


DOS HIPPIES A 2010

Se muitos iam embora, outros tantos ficavam e tornavam-se um incômodo para o sistema, já que muitos dos valores propagados pela contracultura no final dos 60's, chegavam por lá também. Foi o caso do norte americano Sixto Rodriguez, um misterioso cantor de folk rock protesto, completo desconhecido em seu próprio país mas que tornou-se ídolo máximo na África do Sul, e causou muita dor de cabeça ao regime fascista. Outro caso é o de bandas como Freedom's Children e SUCK, que tocavam hardrock e psicodelia, para os quais já era prática comum passar uma ou mais noites no xilindró! Reza a lenda que suas apresentações por lugares públicos eram também palco de inflamadas panfletagens estudantis envoltas em verdadeiras nuvens de fumaça entorpecente.
Ademais, mesmo sendo produtiva entre os 70 e 80, à exceção do pop açucarado do 4 Jacks & A Jill, da easy listening do maestro Dan Hill, de punks como Radio Rats/Pop Guns e Fathoms Of Fire da new wave do Via Afrika, a cena sulafricana manteve-se carente de ícones, já que iniciava-se um processo de "clonagem" do que se fazia na Inglaterra e nos EUA. Logo, o maior nome de então foi a rádio Springbok que nunca deixou de rodar o que se produzia por lá, ainda que fossem só covers de rock importado e muitas novelas importadas da Austrália também.
Na segunda metade dos anos 90, com um giro maior da informação, os ventos da mudança sopravam e novos nomes surgiam, fundindo estilos consagrados como punk, gótico e metal, e muito do pop de seu tempo a elementos da world music, ocorria um "renascimento" na cena, e nomes como Springbok Nude Girls, Urban Creep, Matthew Van Der Want, Ashton Nyte etc tornariam-se figurinhas fáceis.
Nos dias de hoje, mesmo com bacaninhas da envergadura de Dave Matthews, BLK JKS, The Parlotones e 340ml (moçambicanos radicados em JHB), a África do Sul apresenta-se ao mundo como um celeiro incrivelmente produtivo em termos roqueiros, com sons para todos os públicos e gostos.

Por hoje é isso, caríssimos. Um grande abraço a todos e até a próxima!


CEDÊS:

CAZUMBI (No Smoke, Portugal)

CAZUMBI 1



CAZUMBI 2


Esta série conta a história do rock no continente africano, entre as décadas de 60 e 70. Mesmo que as bandas sejam em sua maioria da África do Sul ou de Moçambique, é possível deparar-nos com diversas pérolas de países como Angola, Congo, Gana e Costa do Marfim. Destaque especial para as sulafricanas John E. Sharpe & The Squires, The A-Cads e The Gonks, as moçambicanas Os Inflexos/Os Impacto, H2O, e a congolesa Les Krakmen.

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Artigo originalmente publicado no Jornal Folha do Estado, Cuiabá-MT, domingo, 20/06/2010.



2 comentários:

Coffee Music Cine disse...

Max!! Sou o Rômulo da loja Porão. Blz?

Estou lendo teu blog aqui! Muito bom

Abração!
www.coffeemusicine.blogspot.com

highhellhills disse...

caraca ficou mto bom MaX. O trampo de pesquisa tá do caralho.